quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Mais cedo ou mais tarde.



Hoje larguei o eyeliner, o rímel, a base e o blush. Larguei os saltos, o vestido e a mala. Larguei o telemóvel e saí. Antes de sair, destranquei a porta das traseiras. Nem a chave queria. Não queria nada, só sair. Sair dali, sair de todo o lado. Queria estar sozinha, queria pensar, queria voltar a encontrar-me. Tenho-me vindo a perder com o tempo. Então saí.

Às vezes é mais fácil largar tudo e sair. Durante uma, duas, três horas, o necessário, do que ficar a bater com a cabeça em todas as paredes e a respirar o mesmo ar poluído de mágoas. Não muda uma vida, mas pode mudar um dia. Mudei o hoje e amanhã poderei mudar o amanhã, depois de amanhã mudarei o depois de amanhã e assim sucessivamente. Passo a passo. Passo a passo tendo a mudar os meus dias. Mas confesso, confesso que não reconheço a pessoa que sou, ou pelo menos ainda não me habituei a ela.

Apesar de hoje ser aquilo que sou, baseado nas minhas experiências até então, sempre tive uma imagem daquilo que não queria ser. Mas nunca pensei que o que quer que se passasse comigo me aproximasse dessa imagem que não queria para mim. Nunca fiz a mínima ideia. Mas pensando melhor, acho que acaba por ser o que tem de acontecer. Enquanto damos demasiado de nós a quem não merece nada e batemos às portas de quem não quer abrir, vamos começando a fechar nós a nossa porta e pior é que, gostamos tanto da nossa porta fechada que daí a fazer uma muralha é só um pulinho. Mas por que não?

Sinto-me bem na minha muralha, sinto que agora sim, só cá está quem realmente faz falta. Sem visitas inesperadas e estadias de 10 minutos. Entra com o aviso prévio de uma carta e a subida dos portões. E, se quer sair, rapidamente é atirado para o calabouço. Enquanto isso, vou atirando azeite quente e afins para o lado de fora das muralhas. E tem funcionado na perfeição. Afinal de contas, qual é o interesse em abrir a porta de casa e deixá-la aberta? Não, não tenho disso. Tenho todo o gosto em arranjar um tapete bonito de boas-vindas, mas só coloco o tapete já dentro de casa. Nada de tapetes à entrada do lado de fora.

Estive fora duas horas, e cheguei à conclusão de que estar solteiro e de coração partido é quase o mesmo que viver uma relação à distância. Ficas com o tempo todo para ti, e o problema é esse. Acabas por ser obrigado a redescobrir-te, a orientar-te. E tudo porque estavas habituado a que de alguma forma o teu tempo fosse dividido com alguém, com quem quer queiras, quer não, acabavas por também partilhar os teus e os seus gostos. A diferença entre o primeiro e o segundo “conceitos” é que no segundo, ainda acabas por ter lá aquela pessoa ao fim do dia, que te pergunta como foi o teu dia e que te conta sobre o dela, independentemente da distância que vos separa e do meio que utilizam para entrarem em contacto. Por sua vez, no primeiro quando chegas a casa ao final do dia, apenas podes miar de volta ao teu gato. Mas sim, quero acreditar que as duas situações têm uma certa semelhança, visto que o que passa a estar em causa é o “e agora? Que é que eu faço? Tinha uma hora disponível”. E atirem-me quantas pedras queiram… mas para mim, o facto de termos alguém que amamos na nossa vida e que está presente nela, traduz-se por acrescentar a vida à vida um do outro. Ou seja, já somos pessoas completas, temos os nossos programas, os nossos amigos, as nossas mentalidades e os nossos valores, e temos aquela pessoa. Não me venham dizer que namorar alguém é arranjar algo que me complete, porque não é. Eu sou completa, apenas vou arranjar alguém que se identifique comigo de alguma forma, seja de qual for. Ou que simplesmente, de tudo aquilo que eu sou, consiga com que eu seja o melhor de mim. Não me venham com conceitos de “caras-metades” e “almas gémeas”. Como é que se pode arranjar uma cara-metade depois de mil aprendizagens e mudanças? Certamente que por esta altura a minha cara-metade já desistiu de me procurar, porque se o destino fez de mim a sua única cara-metade e já eu estou como estou, então pobre coitado. Peço-te mil desculpas por te ter deixado de mãos a abanar então, meu querido. Por isso, sim, acho que todos nós encontramos alguém, mais cedo ou mais tarde, depois de 10 ou de 100 outros alguéns, alguém que já mudou tanto quanto nós, e que tem plena consciência de que eu, tal como ele, já sofri que me chegue para andar a distribuir estalos de livre e espontânea vontade e que por isso, se estamos nisto juntos, então é juntos mesmo, sem joguinhos, sem manhas, sem mentiras e ilusões, sem falsos sentimentos. Alguém que me ame com o que lhe resta nos cacos partidos, passando assim a redundância. Só isso e nada mais. Não peço para sempre’s e arrobas no final de cada mensagem, não peço 24h em constante contacto, não peço “mariquices” para celebrar a nossa relação de mês a mês, não peço jantares românticos em restaurantes. Peço sim alguém que saiba que não sou nenhuma princesa da Disney só por ter o cabelo quase até ao rabo, e que tenha consciência de que sim, eu vou falhar, vou falhar várias vezes até; que nem sempre vou pedir explicações mas que quando pedir quero nada mais que a verdade; que saiba que um piquenique ao domingo já é o suficiente para eu deixar todo o mal para trás das costas.

Mas… sabendo que isso não vai acontecer ou pelo menos não tão cedo pois, fazendo uma estimativa diria que apenas lá para os meus 30 anos (com sorte) é que encontro um homem da minha faixa etária (mais coisa, menos coisa), que tenha o cérebro no local correcto (se é que me faço entender) e que, por isso, queira largar as aventuras e avançar com algo sério. Ou seja, tenho cerca de 10 anos, 10 anos importantes da minha vida, para pensar bem e mentalizar-me mais que suficientemente bem  para o dia em que, daqui a 10 anos irei encontrar essa pessoa… já pensei, das duas uma: ou planeio já qual vai ser o meu vestido de noiva, ou planeio já no nome a dar ao cão ou gato que vamos ter… Ou então não, não mesmo, chega de tretas. Com todo este discurso acho que tenho que ir dar outra volta, e esta tem que ser de umas 4 horas. Talvez vá sim… agora que o sol já se pôs, a temperatura já baixou, mas dentro de casa continua um calor infernal. Talvez tenha falta de açúcar, mas antes a falta de açúcar que o açúcar a mais, não é verdade? Chamem-me louca.




Redigido por: SusanaCMMelo