segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Vivo numa cidade que não é minha

  Há uns tempos escrevi um texto que começava com: "Vivo numa cidade que não é minha. À procura de um futuro que chamo de meu. E do qual não faço a mínima em que conste. Todos os dias a mesma rotina, as mesmas caras que me sorriem falsamente e os mesmos objetivos. Sempre ouvi que a vida é dos fortes, que dos fracos não reza a história. E sempre fui educada para fazer parte dos que venceram."

E o texto continua. Talvez um dia o mostre para quem me lê. Ou talvez não. A verdade é que é a partir do que deixamos escrito e marcado, que vemos a nossa evolução. O nosso crescimento. Enquanto pessoas e nas nossas vidas. A verdade é também que, muito provavelmente, metade de nós não sabe o que anda a fazer. Se calhar, um dia sabemos o que queremos ser e atingir, e no outro já nem sabemos quem somos. Sabemos que temos que estudar para ser alguém, sabemos que trabalhamos porque precisamos de dinheiro para viver e sabemos que estamos com alguém porque até agora não houve melhor hipótese. E muitas das vezes, nem paramos para nos perguntar o que realmente queremos ser e com quem realmente queremos estar. É muito fácil perdermo-nos. Ou porque não temos tempo para o que queremos fazer ou porque não temos dinheiro, ou porque não é de um dia para o outro que conseguimos, ou porque temos outras prioridades. Etc etc. E com tudo isso, esquecemo-nos. E o que queremos nós realmente? Será que estamos mesmo a fazer de tudo para o conseguir? Ou será que nos acomodados em mais de metade das desculpas que encontramos pelo caminho? Será que é tão difícil assim? Será que o comodismo do dia a dia é assim tão forte ao ponto de deixarmos passar ao lado, nem que seja, o único sonho que tenhamos? Quantas vezes paramos para pensar e refletir se o caminho que estamos a tomar é mesmo o certo? Quantas vezes têm de nos perguntar o porquê que trabalhamos onde trabalhamos se temos a vida toda pela frente, ainda que sejam escassas as pessoas que se incomodem o suficiente para o perguntar? Quantas vezes temos que nos sentir infelizes e miseráveis num curso que não gostamos, porque é o que será melhor para o nosso futuro, mesmo que em nada tenha a ver connosco? Quantas vezes temos que perdoar alguém que nos magoa vezes sem conta porque nos dizem que ficamos bem juntos? Quantas vezes temos que bater com a cara no chão para tomar um rumo à vida? Quantas vezes temos que ficar abatidos por termos um emprego que é um trabalho, para procurarmos algo que nos realize mais? Quantos dias ou meses vamos dizer que é só mais um dia ou um mês, até finalmente batermos o pé? Onde estão os nossos sonhos e ambições? Onde está a nossa vontade de querer mais e ser mais? Porquê que, nesta sociedade, é tão fácil deixarmo-nos levar pelo comodismo, pela arrogância e pelo "facilitismo"? Porquê que, nos esquecemos de quem queremos ser? Não só a nível profissional, mas também a nível pessoal. É tão fácil ser-se mau, vingativo e falso, que quem se mantém puro de si, pensa que o problema é de si. Porquê? Porquê que quando se ouve perguntar a alguém "quem és tu?", a resposta são balbucios? E porquê que quando se pergunta "És feliz?" (ainda que não seja qualquer pessoa que se lembre ou preocupe de o perguntar), é preciso pensar tanto antes de responder? Porquê que é tão fácil nos deixarmos perder? Porquê que é tão fácil nos esquecermos de quem somos ou queremos ser? Porquê?



Redigido por: SusanaCMMelo



sexta-feira, 21 de abril de 2017

Nós

Dizem que o amor é cego. Mentira. O amor vê tudo, vê todas as imperfeições, todos os defeitos e todos os podres. Mas o amor decide aceitá-los. O amor coloca-se a pés juntos com a esperança. Até ao dia em que a esperança acabe. Até ao dia em que os erros sejam demasiados para fechar os olhos ou para perdoar. O amor não é a obsessão, o amor é acreditar que pode resultar até ao dia em que nos coloquemos diante do espelho e cheguemos à conclusão de que não dá mais. Porque o amor também tem disso. O amor por outra pessoa tem limites. E esses limites são alcançados quando o amor por nós mesmos é derrubado. O nosso amor próprio é o que tem de estar acima de tudo. Só assim saberemos quando somos amados na mesma medida, porque merecemos ser amados por igual. Não adianta de nada amar mais alguém do que essa pessoa nos ama. Só nos sufoca. Só nos destrói. Amamos tanto alguém sem ser amados da mesma maneira, que quando batemos no chão nem acreditamos que lá estamos. Quase que nem sabemos como lá chegámos. E eu sempre ouvi dizer que para amar temos de ser amados. Amor com amor se paga. De nada vale tentarmos fechar num casulo alguém que nunca vai florescer. Porque nós sempre sabemos. Nós sempre sentimos. Sentimos quando a nossa dimensão não é a mesma e quando por muito que façamos nada vai resultar. E por muito que durante muito tempo não desistamos, a verdade é que chega sempre o dia em que caímos de joelhos. Não vale de nada lutar por quem não quer ser lutado. Não vale colocar as nossas forças em quem demonstra não querer o mesmo que nós. Não vale de nada tentar salvar alguém, que por si mesmo não queira ser salvo. E nós, mulheres, sabemos. Sabemos sempre. A verdade é que quando é para resultar resulta, mesmo que depois de algum esforço, mas sem nunca ser necessário ferir o nosso amor próprio. Porque quando o nosso amor próprio é ferido, meu bem, é porque não tem como dar certo. E não, ao contrário do que se possa pensar, não é por falta de tentativas. É sim por demasiadas tentativas falhadas.
Para todos os corações partidos,
Com bastante amor.


Redigido por: SusanaCMMelo



segunda-feira, 27 de março de 2017

A ti.

Dou por mim a não saber o que quero. Umas vezes a mais segura em mim própria, outras vezes a mais perdida. Houve uma altura que já não sei bem quando em que parecíamos corretos. Depois, do nada, já pensávamos que nunca iria dar certo. E por muito que de certa forma até tenha dado, acabou por não dar. Acabou por levar um bocado grande de ti para bem longe de ti, e mais uma das pequenas porções que de mim sobrava. Seguiste outro caminho, um que por sua vez te pareceu mais iluminado mas que a meu ver, era simplesmente mais fácil. Nunca fui a pessoa mais acessível do mundo, sempre fui complicada em muitos aspetos. Enfim. A nossa história eu nunca a teria apagado de lado nenhum. Nunca teria deixado que lhe rasgassem páginas e durante muito tempo dei por mim à tua procura ou do mais pequeno excerto de ti. Ou assim eu achava que era. Numa rua qualquer  independentemente de lá termos alguma vez dado as mãos ou não, sem me aperceber percorria todas as caras que passavam por mim com os meus olhos. Olhava desesperadamente para todo o lado. A cabeça girava dum lado para o outro freneticamente. E o coração de tanto bater quase me saltava pela boca. Repito, nunca deixaria que rasgassem as nossas páginas. No entanto, o tempo apagou-lhes as letras.
  Por um tempo eu quis-te escrever. Quis escrever o bocado mais doce de ti. Mas o doce ainda não estava doce, pelo contrário, ainda amargava. E o que nos amarga de lembrar nós não queremos recordar. Preferimos deixar. "Deixa que o tempo cura". E cura. Até um certo ponto. Chega uma altura em que o que está estragado parece que já não tem volta. Por muitas frases bonitas que nos digam e por muito que nos levem a ver as estrelas numa noite calma. Simplesmente não se regenera. Como os pratos de porcelana que se partem e de seguida os colam. Nunca fica igual. O nosso coração é assim. Magoamos e magoam-nos, perdoamos e perdoam-nos. E volta, magoamos e magoam-nos, perdoam... não, perdoam-nos e já só depois perdoamos. Seguimos a vida e apaixonamo-nos por outro alguém com uma outra história. E o que conheceste ficou para trás. A vida segue e o nosso coração tenta acompanhar ao mesmo ritmo. Um pedaço de porcelana colado por milhentas vezes. Que um tanto ou quanto mais amargurado vai ficando, tentando aos tropeços ganhar um pouco de luz e conseguir com que alguém o ache bonito com todos os remendos. E de certa forma que o é. Magoamos e perdoamos. Mais bonito não podia ser.

  A verdade é que te escrevi por entre algumas linhas. Assim como já falei de ti sem nunca te mencionar. Sem nunca ter de explicar donde vem o que digo e sinto, como se apenas o dissesse e talvez sentisse. Como se se tratasse apenas de sabedoria e de um pouco de exagero. E se agora que te escrevo, te pudesse expor o que sinto? Se eu pudesse, numa varanda às 2h da manhã sob o céu escuro e as estrelas te confessar que queria ter conseguido assentar a tempo de chegar de mãos dadas à beira do meu avô e ter dito "vê avô, consegui arranjar alguém que é bom para mim". Se eu te pudesse confessar que queria que esse alguém bom tivesses sido tu. Se eu te pudesse confessar que nunca o cheguei a fazer, que nunca lhe mostrei que estava finalmente bem e feliz. Que nunca chorei de felicidade mas que já derramei oceanos de lágrimas por todos os motivos que não devia. Se eu te confessasse que o último beijo na testa foi o teu. E que foste das últimas pessoas a abraçar-me com sentimento. Se eu te confessasse que nunca mais ri como ria contigo e que nunca mais fui a musa de ninguém. Se eu te confessasse, nessa varanda às 2h da manhã, por baixo do céu escuro e das estrelas, que houve alturas em que quis dar o que sobrava do meu mundo para acreditar que me destinava algo melhor mas que o destino me pregou uma partida e todos os dias se ri de mim. Acreditavas?




Redigido por: SusanaCMMelo



quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Mas quando é que isto acaba?

Ouvi-te chegar e fiquei parada à tua espera. A saudade que tinha de ti era equivalente a 10 anos ou mais sem te ver. E eu todos os dias esperava, com a fidelidade igual à de um animal, por ver-te chegar.

Todos os dias tinha uma surpresa para ti. Uns dias bolos, outros sobremesas, outros o almoço, o lanche ou o jantar, dependendo da hora a que te apetecesse chegar. E o mundo parava de rodar cada vez que esperava mais do que era de esperar por ti. Uma hora, duas, três… cheguei a ver-te chegar de madrugada, perdido, pelo meio dos raios matinais que se queriam fazer ver. E de todas as vezes, todos os dias, todos os meses e anos nunca me faltou um sorriso para te dar.

Um sorriso aqui, um murro ali.

Sempre quis pensar que com o tempo as coisas mudariam. Que melhorariam.

Chegaste a casa com o jantar posto na mesa, as velas do costume acesas e o meu melhor sorriso. Em pé, encostada ao balcão frente à porta, a contar os segundos até ouvir-te chegar. Quando finalmente te vi, soube que de todos os meus esforços não iria haver nunca algum que te fosse suficiente. E li-te a raiva nos olhos. Mais sabia eu como iria acabar.

Largaste tudo, dirigiste-te a mim, esbarrando em tudo o que se encontrasse no caminho e empurraste-me.

Aproveitei a força que fizeste em mim para me afastar de ti e correr o mais possível, mesmo que não houvesse muito para onde correr. Mas corri. Consegui chegar ao quarto e fechei a porta. Os teus gritos ecoavam pela casa, assim como as tuas ofensas e os teus murros.

E por entre tanto barulho eu só conseguia pensar no quanto eu gostava de poder apagar as luzes e jantar sob as velas, sem ofensas e ameaças. Mas a realidade já estava a ser sufocante, o meu corpo tremia e as forças consumiam-se. Eu sabia que a minha fraqueza ia ceder, como sempre, e já tinha o cenário todo mais que decorado. E eu sabia melhor do que queria acreditar que por muito que já conhecesse o guião todo e assim me pudesse esquivar, pois conseguia prever os teus próximos passos e antecipar a minha defesa (como quando me empurraste), não me podia nem conseguia esquivar de tudo.

Senti os meus braços e costas ceder, as minhas pernas fraquejar. Inspirei, uma prece rápida e uma engolida de choro. Mas já era tarde demais. Do quarto não havia para onde correr. A porta abriu, mal dei um passo de fugida, senti os cabelos serem puxados, consegui virar-me e por muito que tentasse, uma mão agarrou-me e apertou-me o pescoço. Uma mistura entre calor e frio, uma mistura entre a vontade de lutar e a de me deixar ficar. Olhei-te nos olhos na esperança de te conseguir ler, mas não havia nada com que me pudesse familiarizar. A raiva que tanto tinhas dentro de ti nunca a consegui perceber. E por breves instantes me lembrei de quando quem fazia as surpresas eras tu e que quando as fazias eram rosas e poemas, no teu mais belo e encantador “eu”.

Mas rosas e poemas não duram uma vida, e no meio de toda aquela confusão deixei de me debater e de tentar, ainda que de forma impossível, engendrar uma forma de escapar de ti.

Apaguei-me. Larguei as poucas forças que me restavam e deixei-me ali. E no meio das minhas lágrimas sussurrei a Deus que fosse dessa vez que levasse a minha alma.

Mas não levou.

Perdi-me no meio do tempo e do espaço e desejei, por mais uma vez, nos segundos que me restaram de lucidez poder evaporar-me.

Entre o céu e a terra foi onde Ele me pôs. A claridade que vem das janelas arde-me nos olhos.

Chamo-me Laura, tenho 25 anos, uma costela partida, um ombro deslocado, um olho inchado e nódoas negras e dolorosas por todo o corpo. E, como de todas as vezes, flores e cartas ao fundo da minha cama de hospital. Flores que nunca mais acabam e que só de olhar me deixam enjoada.

Nunca o consegui perceber. O porquê de numas vezes aquilo a que durante tempo me iludi chamando de amor, e noutras vezes tanto ódio? Que mal fiz eu? Onde é que eu errei? Qual é a minha falha de toda a vez em que mudaste o teu olhar para algo demoníaco? De toda a vez em que me sorrias e logo a seguir me batias como se me odiasses? Onde está o príncipe do nosso início, onde está o cavalheiro que prometia mundos e fundos? Tivesse eu sabido logo de começo como iria ser, não tivesse eu tido toda a ingenuidade que tive. Quem sabe não estaria agora a rezar por mim própria, para que os meus olhos se fechem e nunca mais abram. Soubesse eu do teu ciclo vicioso e doentio, de como me chamas fraca mas fraco é o teu ser. De como alguém consegue ser tão horrivelmente doente. E por “amor” achamos que ficamos. E de “amor” nada sabemos. Porque no amor não há disto, no amor tem que haver respeito e uma mão cheia de coisas que não sei bem o que são, mas que não interessam muito só porque na primeira já tu pecaste mais de mil vezes. E dos mundos e fundos, só lhe vi os fundos.

E a claridade está-se-me a dissipar. De repente ficou tudo turvo, a querer escurecer. Dói-me o corpo e a alma e de tudo o que me dói já nem sei onde dói mais. Sinto-me como a escorregar pelos lençóis, a cabeça a andar à roda, o sangue a fervilhar e ao mesmo tempo a regelar.

Tenho uma hemorragia interna grave.

Mas quando é que isto acaba?






Redigido por: SusanaCMMelo



quarta-feira, 2 de novembro de 2016

É legítimo?


No meio dum dia sofrido no meio de lições esquecidas, disseram-me que a nossa vida só nós controlamos e que, se há algo por que estamos a sofrer, que temos que ter em conta se realmente vale a pena sofrer por isso ou se é apenas o nosso coração a iludir-nos. Mas que no meio de tudo, que não nos deixemos humilhar demais nem moldar demais, senão um dia olhamos para trás e perguntamo-nos como chegámos a esse ponto e nem nos reconhecemos mais. Que no entanto, só nós sabemos o que vale a pena e até quando vale a pena.

E no meio de um quarto escuro ainda consigo lembrar-me de choros, gritos e cheiros antigos. Ainda consigo sentir as cicatrizes antigas. E de cada vez que sofro, sofro por todas elas. E que de cada vez que me é feito sofrer, sofro em memória a quem deixei nas páginas de livros já lidos. O meu avô dizia que quando eu arranjasse um namorado a sério, que tinha que ser um homenzinho. Que tinha que ser alguém que me cuidasse e amasse. E ele abanava a cabeça como quem sabe que hoje em dia as pessoas se dão umas demais e outras de menos, mas que acabamos todos por mais cedo ou mais tarde já nem nos dar.

Não nos damos porque ficámos sofridos, em algumas das páginas e porque não fechámos o livro, porque talvez decidimos continuar a lê-lo independentemente do mal que nos estivesse a fazer, porque na altura não o reconhecíamos como mal, mas sim como uma hipótese de ver a história a mudar. Ficámos sofridos e pior que ficar sofrido é fazer sofrer. Fazer sofrer quem por nós travaria as maiores guerras e atravessaria os maiores desertos, pularia de estrela em estrela e mesmo de cara esmagada no chão, se levantaria para nos proteger. E daí vem o destino, o fazer doer a quem já doeu demais e o não conseguir evitar que não faça doer. Daí vêm corações partidos e mentes desacreditadas.

Escrevi algures que acredito em amores para a vida, no “felizes para sempre”, ainda que discutam, e que no meio de tanta promiscuidade, possa haver um homem em mil e uma mulher em mil que acreditem no amor e que esse homem e essa mulher um dia se possam encontrar. Mas também escrevi que o amor não existe hoje em dia. Que independentemente do que aconteça há sempre alguém melhor, mais bonito e mais acessível. E que tentar custa muito, que amar na verdadeira definição da palavra é quase que impensável. Já não se sente e já não se pensa. Costumo tentar acreditar que quando se gosta, se pode fazer crescer e se pode trabalhar em conjunto no que se tem. Porque ninguém rema contra a maré e porque para dançar o tango são precisos dois. Porque acredito que podemos sempre investir no que temos seja em nós ou em algo que seja nosso, ou a que possamos de algum modo chamar nosso. Nada de deitar fora nem trocar. O meu pai, ao longo do tempo em que vivi com ele, de toda a rara vez em que me ofereceu alguma coisa sempre fez questão de dizer que era a primeira e última vez que me dava o que quer que me estivesse a dar. Que se eu partisse, estragasse, perdesse ou fosse o que fosse, não voltaria a ter outro igual. Passou por brinquedos, livros, telemóveis, qualquer coisa que viesse dele. Fui ensinada com o culto do “estima para durar” acompanhado do “um dia vais dar valor” e do “para ti é”. Hoje em dia, percebo que esse culto realmente é uma forma de estar na vida. Tão depressa posso ganhar como posso perder. Passe por trabalho ou namoro, o que seja. Mas que, se eu fizer por e lutar por, as probabilidades de ser eu a ganhar serão maiores. E ele nem estava errado de todo, visto que, de todas as frases que ouvia do meu pai, hoje posso aplicar sempre uma para todas as situações, ainda que boas ou menos boas.

E então, o que acontece quando, depois de um coração partido por mil vezes, nos voltamos a dar a alguém, ainda que aos tropeços? Ainda que, por muito esforço que possamos fazer na viagem, nos tentemos dar o melhor inteiro de nós que consigamos arranjar, ainda que colado com cuspo? E o que acontece quando, o destino junta ou pensa que junta dois corações partidos? Será que é de alguma forma legítimo para connosco nos reservamos a certas coisas e afastarmos outras tantas? Fazer sofrer, ainda que inconscientemente, porque estamos ou fomos sofridos? Fazer pagar quem de nada culpa tem, por erros por outrens cometidos? Haverá algum livro de amor ou simplesmente de ajuda que nos indique o degrau a seguir? Como, se “cada um é como cada qual” e “as relações são todas diferentes”? Será que somente um sexto sentido e as energias interiores dão conta do cargo? Ou será, que sequer, alguma vez, um coração poderá ser reabilitado?

Respostas escassas para perguntas que a cada quarteirão se triplicam num dia em que de sofrido já não podia ter mais nada e que em nada um quarto escuro me poderia ajudar. E são mais as voltas e os cigarros que as conclusões. São mais os desassossegos de coração que a vontade de dormir à noite. É legítimo pagarmos pelo passado de alguém?

Sinceramente, a melhor definição de amor que alguma vez ouvi foi numa noite em que já nem me lembro como acabou. E honestamente nem me lembro da definição em si, mas sei que soou bonito.

Soou a algo sincero e de certo modo magoado. E porquê que tem que haver beleza naquilo que foi estragado? Ainda que de belo possa haver um olhar ou um sorriso aleatórios, que vêm inesperados, de alguém que julgamos não nos conseguir olhar ou sorrir em certas alturas porque de demónios têm o cérebro e o coração cheios?


Será que, ainda que por breves instantes, em algum universo paralelo, onde todas as matemáticas batam certo e todos os sentimentos sejam puros e bem desenhados, possa haver a pequena possibilidade de o meu eu não estar a ter um dia de merda?




Redigido por: SusanaCMMelo




sexta-feira, 29 de julho de 2016

Quis contar-te

Quis pegar em mim e mandar-te uma mensagem ou ligar-te.

Hesitar mas acabar por dizer-te que estava bem.

Que estava de uma vez por todas a seguir os meus sonhos, a fazer o que era melhor para mim.

Quis contar-te para onde estava a ir, que estava a fazer uma viagem de autocarro de horas e horas e que apenas levei uma mala.

Quis contar-te como é que consegui o dinheiro para deixar a nossa cidade, que trabalhei por horas e horas, dias e dias, sem folgas e com cansaço acumulado.

Quis contar-te que estive sozinha este tempo todo, que a vida sem ti resume-se a pouco.

Quis contar-te que apesar disso nunca desisti e que o que saiu de mim foi sempre o meu melhor.

Quis contar-te sobre tudo o que tinhas perdido.

Que as árvores que vejo fora da janela não parecem tão bonitas.

Que o barulho de outras pessoas à minha volta me incomoda mais que nunca.

Que o sol e a lua parece que perderam o brilho.

Quis contar-te que te odiei mas que guardei o que restou de ti.

Que sinto falta do teu sorriso.

Quis contar-te que tens o olhar mais bonito e encantador que já vi.

Quis contar-te tanta coisa, por gostar tanto de ti, ou da ideia de ti, que me esqueci de quem realmente és.

Encontrei-me para te perder.

Descobri-me para perceber que nem sei quem tu és.

E no final de tudo, pergunto-me como seria se eu ainda soubesse o quão bonitas são as árvores e as flores.

Se eu soubesse apreciar outros sorrisos.

Se eu pudesse gostar da ideia de outro alguém ou de mim mesma.

Pergunto-me, no meio de tudo, vendo a estrada e as árvores lá fora, bem por fora da janela, como seria se, ainda que por um segundo do pensamento, eu nunca tivesse gostado tanto de alguém, que não tivesse gostado tanto de mim.

E lembro-me, no meio de tudo, que nem sequer sei quem és.

E pergunto-me se a vida seria mais bonita se de vez em quando não amássemos, nunca tivéssemos amado ou nunca viéssemos a amar.

E lembro-me que, não há coisa nenhuma no mundo que seja melhor do que ver o que há fora da janela.


E que, a próxima vez que falar contigo te vou dizer que estou bem, sem hesitar.





Redigido por: SusanaCMMelo



sábado, 18 de junho de 2016

Mudam-se os tempos.

Pergunto-me vezes sem conta sobre até onde devemos deixar as coisas ir.

Se podemos traçar a nós próprios caminhos diferentes e possibilidades diferentes a seguir. Se nos é legítimo de vez em quando sermos um bocado egoístas. Batermos o pé e dizermos não.

O meu ex-namorado costumava dizer que sou demasiado boa com as pessoas. Que não sei dizer que não e que por ser tão boa quem se aleija sempre sou eu. Tinha razão. E por ser tão boa com ele acabei trocada. É nisso que me questiono bastantes vezes. Mas de toda a vez que tento ser um pouco má acabo sempre ouvindo a mesma história. “Não ganhas nada em ser assim”. Não sei o que ganho então. Percebo agora os erros que cometi no passado e o porquê de todos os relacionamentos passados terem saído fracassados em todos os piores sentidos. Não que eu fosse má como as cobras, não que fizesse o mal. Muito pelo contrário. E esse é o meu mal. Onde será que devemos pôr um ponto final? Quando será que devemos dar um grito e bater o pé?

Sendo que sou apologista de mulheres calmas, com sentido de humor, perspicazes e divertidas quando têm que o ser, mas no fundo sempre humildes. E sendo que tento seguir esse padrão. Será que existe realmente um ponto em cima do i desesperado nessas mulheres? O papel delas passa por calar e dar desprezo a um homem que amam ou gritam e debatem-se até não poderem mais?

Tenho uma amiga que como eu gosta da sua independência. Essa mesma mulher diz-me que é independente e como tal não precisa de ninguém para ser feliz. Essa mulher é o hino das mulheres. E só nisso todas devíamos ser um bocadinho como ela.

Eu acredito em amores para a vida, no “felizes para sempre”, ainda que discutam. Acredito que no meio de tanta promiscuidade que há por aí ainda haja alguém de verdade. Um homem em mil e uma mulher em mil que acreditem no amor. Aquele amor que hoje em dia já não se ouve falar. E acredito que esse homem e essa mulher um dia se possam encontrar, mas rezo para que não se deixem sugar pelo mal que por aí há. Acredito que num dia ou numa noite qualquer se encontrem por acaso ao virar da esquina. Acredito em amores a cem porcento correspondidos, em que independentemente das feridas passadas possa haver paz e harmonia, tudo em sintonia com o amor e a fidelidade.

Mas acredito também que um coração partido seja impossível de ser consertado. Porque vai desgastando, desgastando, desgastando, até sobrar apenas a vontade de amar mas ao mesmo tempo o medo de amar. E o medo fala mais alto porque adveio do mal. E aprendemos melhor com lições rígidas e pratos partidos do que com as poucas rosas que recebemos. O medo toma-nos. A insegurança vive-nos. Não se cola o que em tempos se partiu. Não se pega nos cacos e faz-se de conta que nada aconteceu. Os cacos cortam, e lembrarmo-nos sequer de que algo em nós foi partido sangra-nos ainda mais.

Eu devia ter vivido no tempo em que os senhores eram senhores e as senhoras senhoras. No tempo em que realmente se sabia dar valor ao que se tinha, ou que se estava prestes a ter. Devia ter recebido rosas ao portão e cartas no correio. Devia ter tido o prazer de ser conquistada por um homem que realmente me quisesse. Noutros tempos, noutras circunstâncias e de certo com outras vontades.

O amor não existe hoje em dia. Não há Romeu nem Julieta hoje em dia. Não há ninguém que ame tanto alguém a ponto de não suportar estar sem esse alguém. Ninguém se deixa ser tão ingénuo, tão ultrapassado. O que gostamos mesmo hoje em dia é de erguer a cabeça e lançar a cana de pesca de toda a vez que algo nem sequer chega ao final de fracassar. A cara vira com qualquer passarinho e os olhos comem à velocidade da luz e o respeito suposto fica na suposição. Há sempre alguém melhor, mais bonito e mais acessível. Tentar custa muito, amar na verdadeira definição da palavra é quase que impensável. Já não se sente, não se pensa. Homens usam a cabeça inferior em vez da superior e as mulheres já nem massa cinzenta têm.

Sou de uma geração perdida, que não sabe lutar pelo que quer e que desconfio que nem saiba o que quer. Pertenço a um mundo onde o amor tem uma nova definição e cujo se encontra em cada esquina.


No entanto, cada esquina é uma esquina perdida.



Redigido por: SusanaCMMelo